O Brexit e a NATO


Eles estão surpreendidos e desorientados. O grande capital financeiro sofreu na Grã-Bretanha uma derrota histórica. As ingerências e pressões de todo o tipo sobre o povo britânico fracassaram. Nem o vergonhoso acordo da União Europeia com Cameron contra os direitos dos emigrantes, nem o empenhamento de Obama por uma «forte Europa», nem os cenários de catástrofe desenhados pelos grandes grupos económicos e financeiros da City e pelos eurocratas de Bruxelas impediram o Brexit. A crise na e da UE é na verdade muito profunda e sendo esta irreformável a surpresa e a desorientação que campeiam nos seus círculos dirigentes são inevitáveis.

Não se subestime porém a capacidade de adaptação da classe dominante – que aliás ainda não desistiu de reverter o resultado do referendo – e, sobretudo, mantenha-se bem viva a vigilância para com a conhecida teoria das «crises criativas» e as tentativas para transformar esta derrota em pretexto para concretizar o novo salto neoliberal, militarista e federalista que tem vindo a ser preconizado e desenhado pelo núcleo duro do processo de integração capitalista. As ondas de choque do Brexit far-se-ão sentir por muito tempo. São muitas as incertezas. Mas não pode haver qualquer dúvida de que o bloco imperialista que a UE é tudo fará para assegurar o seu poder.

Para isso há uma primeira batalha que está a travar sem qualquer hesitação mobilizando todo o seu poderoso arsenal de manipulação mediática. É uma batalha no campo das ideias que pode ser decisiva para os seus objectivos imediatos e que consiste em iludir e falsificar as razões de fundo da vitória do sim à saída da Grã-Bretanha da UE. A fulanização, os erros de cálculo de Cameron ou a falta de empenho de Corbin, a luta pelo poder dentro do Partido Conservador e a conspiração para afastar a ala esquerda do Partido Trabalhista, massas de votantes levadas ao engano por tal ou tal personalidade e, sobretudo, o labéu de que o voto pelo Brexit seria um voto xenófobo e racista – tudo isto está a servir para esconder o essencial: que o voto pela saída é fundamentalmente um voto popular contra a deterioração da situação social que atinge particularmente regiões operárias de tradições progressistas e um voto contra a opressão nacional decorrente das políticas e da dinâmica supranacional da UE. Que isso esteja a ser em grande parte capitalizado por forças de extrema-direita, na Grã-Bretanha como em França e noutros países, é um perigo cuja responsabilidade cabe em primeiríssimo lugar às políticas anti-sociais e de opressão nacional do grande capital.

Um outro terreno onde a classe dominante não mostra hesitar, diz respeito ao reforço do braço militar europeu da NATO. A «política europeia de segurança e defesa comum», a seu tempo justificada pelos «europeístas de esquerda» como acto de «autonomia» e contraponto à hegemonia norte-americana, está cada vez mais articulada com os EUA e estreitamente inserida na máquina de guerra de uma NATO que não cessa de estender a sua esfera de intervenção a todo o planeta. Não é por acaso que logo no dia seguinte ao Brexit (ver Público, por exemplo) tudo eram interrogações quanto ao relacionamento futuro da UE com a Grã-Bretanha excepto no plano militar, evocando-se o poderio das forças armadas britânicas e o tratado de Saint-Malo franco-britânico (1998) que significou um poderoso impulso na militarização da UE. Em véspera da Cimeira da NATO de Varsóvia e da sua perigosíssima agenda, esta é uma razão mais para que, amanhã em Lisboa e sábado no Porto, o povo português erga a sua voz em defesa da Paz e pela dissolução da NATO.

[Publicado en Avante]

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